Geleia de Oxicoco, novo sabor na nossa Aquarela de Sabores
Oxicocos são pequenas frutas vermelhas típicas da América do Norte, lá conhecidas como cranberries. São parentes bem próximos dos blueberries: o nome científico das primeiras é Vaccinium oxycoccus e dos segundos, Vaccinium myrtillus. E uma curiosidade: em Português, adotaram-se como nomes comuns a segunda palavra do nome científico, ou seja, cranberry traduz-se como oxicoco (juro, pode olhar no dicionário!) e blueberry, como mirtilo. O nome mirtilo está relativamente bem popularizado no Brasil mas quando perguntei para amigos e clientes se eles já tinham ouvido falar em oxicoco, a reação foi unânime: uma baita cara de dúvida. Mas quando perguntava se eles conheciam cranberry, a maior parte pelo menos já tinha ouvido falar.
Não sei se é por causa da banda The Cranberries, que fez muito sucesso há uns 15-20 anos por aqui... mas a palavra cranberry acabou soando muito mais familiar e até amigável do que a palavra oxicoco.
Bióloga especializada em pragas de frutas que sou, conhecia essa pequena fruta por causa dos livros que relatavam sua importância como hospedeiro para uma mosca parente do nosso bicho-da-goiaba. Só que nas viagens que fiz aos EUA, só tinha me deparado com alimentos e bebidas industrializados usando essa frutinha que movimenta uma indústria bilionária de sucos, refrigerantes, molhos e geleias.
Por isso, quando vi uma pessoa vendendo as frutas frescas em plena Manhattan em Nova York em novembro de 2019, não resisti e comprei um tanto para fazer geleia. Afinal, eu não seria autorizada a entrar no Brasil trazendo frutas frescas pelo risco delas veicularem pragas... mas potes de geleia seriam um risco aceitável. Desembarquei no Brasil com meu pote de geleia de cranberry e outras tantas que fiz durante a minha estadia em Nova York e fui degustando cada colherada sabendo que não encontraria a fruta fresca por aqui. Confesso que a textura dela não agradou muito, mas ela trazia a lembrança de uma viagem tão sonhada que relevei.
Estamos em 2023 e eu já nem lembrava mais dessa geleia... até que a Adriane, que é da Destilaria Lamas, me propôs utilizar o whisky deles na produção de uma geleia. Caramba. Dezenas de frutas passaram na minha cabeça, mas nenhuma fazia sentido... Afinal, criar um sabor não é apenas juntar ingredientes de maneira aleatória. Pelo menos, não para mim. Preciso enxergar uma conexão entre eles, ter uma referência criativa. Eu já estava evitando passar na porta da loja da Adriane pois não estava conseguindo criar o sabor para ela.
Foi então que uma voz cochichou no meu ouvido: cranberry. Meu deus! Como não tinha pensado nisso antes? Afinal, cranberry misturado com whisky vira um molho super tradicional no leste dos EUA, servido em datas festivas como Dia de Ação de Graças e Natal. E, na falta da fruta fresca, resolvi arriscar com elas secas e deu MUITO certo. Para resolver o problema da textura, utilizei maçãs vermelhas como base e o whisky escolhido pela Adriane foi o Canen, envelhecido em barril de carvalho americano. Assim nasceu a mais gringa das nossas geleias: uma fruta de lá e uma bebida típica de lá, envelhecida numa madeira também de lá.
Agora que você sabe dessas referências todas, vou te pedir licença para usar um estrangeirismo no nome desta geleia tão delicada: ao invés de oxicoco, tudo bem para você se eu batizar esta cor de "Geleia de Cranberry com Maçã e Whisky"?
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