Viaje conosco pela história desse ingrediente que apaixona - e assusta - muita gente
Hoje, temos 11 geleias de pimenta mas nem sempre foi assim. Isso porque até bem pouco atrás, eu não comia pimenta. Dizia que não gostava, mas a verdade é que eu tinha medo. Por isso, quando começaram a nos pedir para fazer geleia de pimenta, dava até um calafrio. Como eu poderia cozinhar algo que não gostava? Foi somente depois de muita insistência que comecei minhas primeiras incursões pelo universo dessas que foram a motivação de grandes navegações no passado sendo, inclusive, símbolo de status e usadas como moeda.
Mas o que são pimentas, afinal? No popular brasileiro, é qualquer tempero fresco ou seco que causa a sensação de picância. Mas, do ponto de vista botânico, a palavra pimenta refere-se a grupos diferentes de plantas. Talvez as primeiras imagens que vêm à mente sejam a da pimenta preta e a das pimentas vermelhas, como pimenta biquinho ou pimenta malagueta. E esses dois tipos de pimenta têm histórias que se complementam.
Explico: a pimenta-preta, também chamada de pimenta-do-reino, é originária da Índia e foi domesticada há mais de 4.000 anos, tendo uma presença marcante na Medicina Ayurvédica. Ela foi introduzida inicialmente no Egito e Oriente Médio mas seu comércio foi intensificado durante as Grandes Navegações. Graças aos europeus, a pimenta-preta introduzida em países como Itália, França, Portugal e Espanha e, pelo seu alto preço, ela passou a ser símbolo de status e até de ostentação.
Frutos da Piper nigrum, espécie da qual são obtidas a pimenta-preta, a pimenta-branca e a pimenta-verde
Enquanto isso, do outro lado do mundo, quando espanhóis e portugueses chegaram ao continente americano, encontraram uma imensa variedade de plantas que produziam frutos coloridos e picantes. De acordo com registros arqueológicos, as pimentas vêm sendo consumidas entre os povos nativos do continente há cerca de 6.000 anos. O nome chilli, originário de línguas nativas mexicanas, foi adotado para se referir a estas pimentas e assim elas são conhecidas até hoje em Inglês como "chilli peppers".
Naquela época, não havia preocupação alguma quanto aos impactos que a introdução de espécies poderia ter nos ecossistemas e os portugueses levaram o chilli para a Índia e começaram seu cultivo por lá. Da mesma forma, trouxeram a pimenta preta para cá e para outras colônias. Se isso foi bom ou correto, não sou eu quem vai julgar, mas o fato é que o Brasil se tornou um dos maiores produtores mundiais de pimenta-do-reino. Ainda no século XVI, o termo pepper passou a se referir tanto às pimentas-pretas quanto aos chillies.
Hari mirchi, ou pimenta-verde, uma das mais usadas na cozinha indiana é nativa do continente americano.
Agora, o mais irônico de tudo é que nem a pimenta-preta e nem o chilli são cientificamente plantas do gênero Pimenta. Não. A pimenta-preta e suas variações (branca e verde) são da família Piperaceae e pertencem ao gênero Piper, espécie nigrum. Ao mesmo gênero pertencem também a pimenta-de-macaco (Piper aduncum) e a pimenta-de-madagascar (Piper borbonenese). Já as pimentas chilli pertencem à família Solanaceae e se dividem em mais de 2000 variedades de cinco espécies do gênero Capsicum. As plantas do gênero Pimenta pertencem à mesma família da goiaba, do eucalipto e da jabuticaba: Myrtaceae. O representante mais famoso é a pimenta-da-jamaica (Pimenta dioica). Essa, sim, é uma pimenta, apesar de praticamente não ter picância.
Botanicamente, o que são as pimentas? São plantas dicoteledôneas pertencentes a pelo menos três subclasses e cinco famílias.
Não consegui descobrir em que momento da história os espanhóis fizeram uma confusão e passaram a denominar de 'pimienta' os grãos de pimenta-preta, mas o fato é que ela perdura até hoje. E sei também que, no meio de tantos nomes botânicos, eu fico mesmo é com a explicação do dicionário, segundo a qual pimenta é uma palavra originária do Latim, com o significado de cor, pigmento ou corante.
Portanto, se você achava que 11 geleias de pimenta é muita coisa, agora começa a achar que é pouco, não é? Afinal, o nosso negócio é cor, ou seja, pimenta! Então, superados os medos, vem com a gente experimentar #maispimentaporfavor
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